FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA |
Carmen Miranda
Boa Vizinhança
Orson Welles no Ceará,
dentro de uma jangada.
Arquivo Vanius Meton Gadelha
Vieira
No esforço de
conquista de alianças para a guerra, os Estados Unidos intensificaram sua
política de "boa vizinhança". Seus fundamentos eram o intercâmbio
econômico, político e cultural entre os Estados Unidos e seus vizinhos
latino-americanos, a defesa da autodeterminação dos povos e a constituição
de uma política conjunta entre os países do continente. Na verdade, essa
política é anterior à guerra. Até o final da década de 20, a política
norte-americana para seus vizinhos ao sul consistia no "Big Stich"
("grande porrete"). Em poucas palavras, significava o uso da intervenção
armada como ultima ratio para a resolução de problemas. A nova postura
diplomática visava pôr fim às intervenções armadas explícitas, através do
estímulo ao intercâmbio econômico e da constituição de política
hemisférica comum às Américas. Com a iminência da guerra, o Departamento
de Estado norte-americano se preocupava com as alianças políticas no
continente. Nas conferências de chanceleres de Lima (1938), Panamá (1939)
e Havana (1940), a participação norte-americana teve o objetivo de ampliar
o pacto de segurança continental e garantir uma "neutralidade" favorável
aos seus objetivos estratégicos. Essa política de alianças, baseada na
"boa vizinhança", deveria ir além de seus aspectos diplomáticos e
econômicos. Deveria abranger também o campo cultural, em sentido amplo.
Assim, os principais objetivos da política externa norte-americana para
com seus "bons vizinhos" continentais não se limitariam a garantir uma
liderança política sem contestações nas Américas, ampliar a integração
econômica em favor dos Estados Unidos, diminuir o espaço das relações
comerciais com outros países europeus e suprimir as influências do Eixo no
continente, mas também incluía a disseminação do American Way of Life,
através da divulgação dos valores culturais e ideológicos do capitalismo
liberal norte-americano. À medida que a sombra da guerra se espalhava pela
Europa e atingia o Norte da África, e o Eixo conquistava cada vez mais
simpatizantes na América do Sul, os esforços norte-americanos para
garantir o apoio latino-americano às suas políticas iam sendo ampliados.
Em agosto de 1940, foi criado o Office for Coordination of Commercial and
Cultural Relations Between the American Republics, mais tarde rebatizado
de Office of the Coordinator of Inter-American Affairs. Informalmente,
ficou conhecido como "Birô lnteramericano" ou simplesmente "Birô", e tinha
sede no Rio de Janeiro. Suas funções eram promover medidas para estimular
a recuperação das economias da América Latina e produzir programas de
educação, cultura e propaganda que disseminassem os valores
norte-americanos de maneira a garantir não apenas a proeminência política,
econômica e militar dos Estados Unidos, mas também a cultural. O "Birô"
era apoiado por grandes empresas privadas norte-americanas e não
economizou recursos nem esforços. Das medidas de "boa vizinhança"
empreendidas, as mais visíveis foram aquelas de caráter cultural.
Hollywood "descobriu" a América Latina e vários filmes foram feitos
utilizando suas temáticas, cenários e atores. No Brasil, a presença de
Carmen Miranda em películas de Hollywood, a criação do personagem "Zé
Carioca", por Walt Disney, e a produção nunca acabada de um filme do
cineasta Orson Welles tornaram-se as "contribuições" mais notórias. No
ritmo do esforço de guerra, procedeu-se a uma crescente monopolização
norte-americana das agências de notícias e meios de radiodifusão.
Intercâmbios culturais e científicos e implantação de programas de
educação e saneamento básico nas localidades carentes complementavam a
"aliança" e proporcionavam-lhe um caráter mais humanitário. Contudo, por
mais que se apresentasse como uma via de mão dupla, na verdade a política
de "boa vizinhança" consistiu na disseminação unilateral de valores e
produtos de consumo norte-americanos. O intercâmbio ressaltava mais ainda
a distância entre o desenvolvido vizinho do norte e os exóticos países do
sul. A essência de todos os programas de intercâmbio era clara: os
norte-americanos eram aqueles que ensinariam os irmãos latinos a crescerem
e se desenvolverem como nações, em todos os sentidos: politicamente, com a
difusão dos ideais democráticos em países com tradições ditatoriais;
economicamente, com o melhor aproveitamento dos abundantes recursos
naturais e humanos do continente, sem os entraves dos nacionalismos
estéreis e dos excessos de intervenções estatais, contrárias ao progresso
do livre comércio e da livre iniciativa; socialmente, com as lições de
como melhorar a educação, os padrões de higiene e saúde e como desfrutar
um padrão de vida melhor. O American Way of Life encontrava, ao sul do Rio
Grande, alunos atentos e aplicados. Enquanto isso, a contrapartida
latino-americana, e do Brasil em particular, era enviar seus recursos
materiais estratégicos e oferecer suas culturas nacionais "exóticas" para
o entretenimento fugaz das massas consumidoras norte-americanas. A curta
duração desse intercâmbio mostra quão pragmática, para os Estados Unidos,
foi essa aproximação. Quando a guerra acabou, a presença da cultura
latino-americana nos Estados Unidos praticamente desapareceu e os
estereótipos pouco edificantes voltaram a preencher as telas do cinema, as
páginas de jornais, revistas e livros e a própria política externa do
país. Fora da área econômica, política e estratégica, as principais
conseqüências, para o Brasil, dessa política de "boa vizinhança", foram,
por um lado, a consolidação do imperialismo cultural, principalmente com a
difusão dos produtos da indústria de entretenimento e, por outro, a
instituição definitiva do norte-americanismo como paradigma cultural, em
substituição ao paradigma europeu (principalmente o modelo francês, até
então padrão de "civilidade" cultural das elites urbanas do
país). |
Em 10/09/1941, um grupo de quatro pescadores cearenses empreendeu um “raid” de jangada, de Fortaleza ao Rio de Janeiro. Manoel Olímpio Meira, o Jacaré, presidente da colônia de pescadores; Manoel Pereira da Silva, o Manoel Preto; Jerônimo André de Souza e Raimundo Correia Lima, o Tatá, pretendiam, com esse feito, levar “uma mensagem de apelo ao Sr. Getúlio Vargas” alertando o presidente da República para as precárias condições de vida dos jangadeiros. Em 16/11/1941, a “Gazeta de Notícias”, no título “Apoteótica Recepção no Rio”, ressaltou o bom êxito da missão dos quatro jangadeiros. Jacaré, ao saber que voltaria ao Ceará, de avião, respondeu, com o humor de homem simples: “Vim feito peixe e vou voltar que nem urubu...” Essa façanha dos bravos cearenses, publicada na revista “Time”, no final de 1941, chamou a atenção do artista cinematográfico norte-americano, Orson Welles, que incluiria o episódio em seu filme “It’s All True”, uma trilogia baseada em histórias verdadeiras, rodado no Brasil. A história daquela heróica travessia de 1941, quando numa frágil embarcação, foram percorridos 2 500 quilômetros da costa brasileira, seria, em parte, rodada no Ceará. Para atores deste tema do filme, foram contratados os próprios jangadeiros. Orson Welles (1915-1985) atingiu celebridade mundial com seu noticiário radiofônico de 30/10/1938, quando provocou pânico em milhares de ouvintes desavisados. Baseado na “Guerra dos Mundos” de H. G. Wells, Orson Welles transformou em crônica jornalística um hipotético ataque marciano à cidade de New Jersey. Em 1940, este gênio versátil escreveu, dirigiu, produziu e atuou em “Cidadão Kane” - sua obra prima -, uma biografia disfarçada do poderoso magnata da imprensa norte-americana William Randolph Hearst, um filme tido, por muitos, como o melhor de todos os tempos, tendo estreado nos Estados Unidos, em 1941. No Brasil, onde permaneceu cerca de seis meses, Orson Welles iniciou a filmagem de “It’s All True”, (Tudo é Verdade), encomendado pelos estúdios da RKO. O filme fazia parte da política de “Boa Vizinhança”, desenvolvida pelo governo de Franklin Roosevelt e coordenada por Nelson Rockfeller, então chefe do escritório latino-americano do Departamento de Estado e sócio da produtora cinematográfica RKO. Preocupados com a indecisão ideológica dos países latino-americanos, diante da guerra, o governo norte-americano - que ingressara no conflito em dezembro de 1941 -, empenhou-se na conquista de uma identidade comum, tentando, através de uma boa relação com sua vizinhança, conduzi-la à adesão da causa dos Estados Unidos e Países Aliados, na Segunda Guerra Mundial. Para isso, urgia a necessidade de um estreitamento cultural entre os Estados Unidos e esses países. Desse projeto participou, também, Walter Disney, com sua criação imortal, o maroto papagaio “Zé Carioca”, personagem inspirado no malandro do Rio de Janeiro, apresentado no filme “Você já foi a Bahia?”, ao lado do Pato Donald, típico representante norte - americano e do galo mexicano. Em 13/02/1942, Orson Welles aterrissava no Rio de Janeiro para rodar “It’s All True”. No Rio, Orson Welles filmou cenas do carnaval carioca, com Grande Otelo e lançando Anselmo Duarte, que iniciou sua carreira de astro como figurante neste filme. Para inteirar–se melhor sobre o terceiro tema de seu filme, a heróica travessia dos jangadeiros cearenses, Orson Welles fez sua primeira viagem à Fortaleza, visitando a terra e conhecendo os costumes de seus protagonistas. A filmagem desse terceiro episódio, iniciou-se em maio e Orson Welles intitulou-o de “Four Men On a Raft” (Quatro Homens numa Jangada). Por ocasião das filmagens na Barra da Tijuca, Jacaré, um dos atores e personagens do filme, perdeu a vida acidentalmente, no primeiro dia de filmagem, quando se reconstituía a chegada dos jangadeiros no Rio de Janeiro. O jornal “O Estado” de 20/05/1942, consternado, noticiou: “Jacaré
morreu afogado na Barra da Tijuca. O filme “It’s All True” ficou inacabado. Pressionado pela RKO, Orson Welles recebeu ordem de regressar, o quanto antes, aos Estados Unidos. Desobedecendo essa orientação, Welles propôs-se a terminar o episódio dos Jangadeiros. Regressou à Fortaleza e prolongou as filmagens até julho daquele ano. Reconstruindo o trajeto dos jangadeiros, filmou também em Recife e na Bahia, regressando aos Estados Unidos somente em agosto. Vários fatores contribuíram para a interrupção desta obra memorável. Entre esses, o rumo da mensagem que ele passaria, diferente daquela orientação da política da “Boa Vizinhança”, que desejava enfatizar uma visão paradisíaca do Brasil. O que deveria ser um documento turístico, com a imagem de um Brasil exótico e alegre, transmitido no exterior pela notável Carmen Miranda e pelos desenhos animados do Zé Carioca, havia-se transformado num libelo social, mostrando o lado real do Brasil, pela câmara de Orson Welles. A direção da RKO despediu Welles e desfez-se de sua produção, reforçando, dessa maneira, toda a lenda criada em torno do filme deste realizador genial. Em 1985, apareceram 314 latas com o material de “It’s All True”, apresentado ao público, em um filme denominado “Isto é Brasil.” A “Gazeta de Notícias”, de 10/06/1942, registrou: “Fortaleza hospedará mais uma vez, o grande cinematografista americano Orson Welles da R.K.O. Radio que se encontra há vários meses no Brasil filmando o sensacional ‘raid’ dos jangadeiros cearenses. A reportagem da Gazeta esteve com o sr. Fernando Pinto, presidente do Jangada Club, o qual nos declarou, que o famoso ‘Cidadão Kane’ é esperado em nossa capital na próxima semana no dia 17 do corrente. O produtor ianque que desfruta nos U.S.A. de um cartaz consagrado vem a Fortaleza concluir a filmagem da película focalizando a vida aventurosa dos homens do mar. Orson Welles, chegado a Terra da Luz, ficará hospedado em uma casa na praia do Mucuripe. Na enseada onde o governo constrói o futuro porto de Fortaleza, Orson Welles filmará as últimas cenas da produção cinematográfica que está preparando sobre o ‘raid’ do saudoso Jacaré e seus companheiros da jangada São Pedro. O Sr. Fernando Pinto que tem sido um protetor dos marítimos e pescadores das praias cearenses, segundo declarou ontem à nossa reportagem, reunirá sábado próximo, a diretoria do Jangada Club, a fim de traçar o programa em homenagem a Orson Welles.” Apresentado a Fernando Pinto por Assis Chateaubriand, Orson Welles hospedou–se, em Fortaleza, cerca de vinte dias, no Jangada Club. Na noite de sua chegada, este clube lhe ofereceu um jantar com a participação da sociedade cearense. O cineasta foi, também, recepcionado no Ideal Club, com “uma reunião chic”, segundo os jornais da época. José Collares Cintra, gerente do Cassino do Ideal, “numa deferência especial, pôs, à disposição de Orson Welles, uma encantadora casa residencial na Praia do Mucuripe, onde todas as manhãs o famoso cinematografista americano filma novos detalhes da fauna dos jangadeiros pescando no mar.” Em 18/06/1942, a “Gazeta de Notícias” focalizou a procissão de Jangadas que se faria em homenagem a São Pedro, sendo filmada por Orson Welles, tentando fixar todos os elementos folclóricos e religiosos do ato. “Segundo informou à nossa reportagem o Sr. Fernando Pinto, presidente do Jangada Club, a procissão de jangadas, partirá do Mucuripe, num trajeto marítimo que terá como ponto final a Praia de Iracema. O Sr. Fernando Pinto acentuou em suas declarações à reportagem, que a Procissão de São Pedro, padroeiro dos nossos jangadeiros, este ano contará com a participação de mais de cem jangadas. É pensamento de Orson Welles, finalizou o presidente do Jangada Club, filmar todos os atos litúrgicos da procissão, enquadrando-os numa produção de pequena metragem.” Incalculável multidão assistiu a essa procissão, encerrada com uma missa na Igrejinha de São Pedro. O Jangada Club promoveu todas as festividades dessa comemoração a São Pedro. A sua frente, registrado em fotografias estava seu patrocinador, Fernando de Alencar Pinto. Vanius Meton
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