FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA

 

A VOLTA À PÁTRIA


Tropas da FEB retornam ao Brasil
Arquivo Gen. Tácito Theóphilo Gaspar de Oliveira

"Retornar!  Foi a ordem mais gostosa que ouvi em toda minha vida! A guerra acabou e estávamos de volta à terra natal! Na altura de Recife, Pernambuco, veio ao nosso encontro um cruzador da Marinha Brasileira. Sua guarnição, perfilada no convés, nos prestou continência de estilo e, em seguida, nos fizeram a escolta até a Baia da Guanabara, no Rio de Janeiro, onde fomos recebidos por uma legião de barcos, recebendo uma salva de tiros, disparados do Forte de Monduba. Pisando, novamente, em terras brasileiras, recebemos café e lanches, distribuídos por moças da Legião Brasileira de Assistência. Depois de tantos serviços prestados ao meu querido Brasil na luta pela liberdade e democracia, o resultado final é que fomos esquecidos. Esse é o meu maior trauma, a minha grande dor."

Sgt. Antônio Maitinguer, da 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária
Depoimento a Mercedes Pacheco - "Odisséia e Vitória da FEB" 
 1ª Edição - 1981


Toque de saudade em Pistóia.
Foto escaneada do livro "A Epopéia dos Apeninos" - José de Oliveira Ramos

O CEMITÉRIO - Março 1945.

Em San Rocco, perto de Pistóia, está o Cemitério Militar Brasileiro. Visitei-o no dia 6 de março - um dia de sol bonito. Uma cerca de arame com moirões pintados de branco separava aquele trecho da planura. Em toda a volta há plantações de oliveiras, entre as quais vai crescendo o trigo. Lá dentro, enfileiram-se as cruzes simples, também pintadas de branco. Num mastro muito alto, a bandeira do Brasil. Aqui e ali já estão plantadas as árvores - ciprestes, louros, pinheiros, e junto ao mastro os trabalhadores estão acabando de fazer um canteiro. Junto à cerca começa a crescer uma sebe. Do lado de fora um soldado monta guarda. Nem todas as sepulturas dispõem ainda das cruzes pintadas de branco. Algumas ainda estão assinaladas somente por tábuas fincadas no chão - mas as cruzes estão sendo feitas. Em cada cruz está pregada a chapa de identificação do soldado (que todo homem leva presa a uma corrente, em duplicata) e ainda uma chapa de metal um pouco maior. Em algumas cruzes não está pregada a placa: algum homem que foi identificado pelas impressões digitais ou por outro meio admitido em lei. Há três com esta simples inscrição: "soldado brasileiro desconhecido". No mesmo cemitério, separados por uma fila de pequenas oliveiras centenárias, estão os túmulos de alguns mortos alemães. Quase todos puderam ser identificados, mas ali também há alguns desconhecidos. Os túmulos são exatamente iguais aos de nossos homens: enfileirados, cada um com um monte de terra batida e a cruz branca. Examino uma cova aberta. Tem dois metros de comprimento por 60 centímetros de largura e mais de um metro e meio de profundidade. A terra vai apenas até uns dois palmos e meio: dali para baixo o terreno está cheio de pedras. São pedras sem arestas, como os seixos dos rios. Essas pedras são de tamanhos diferentes. Elas são retiradas e separadas com três peneiras em tamanhos diferentes, e servem para pavimentar os caminhos dentro do campo. Terra para encher as covas é tirada de outro lugar do cemitério, atrás do mastro. Nem todos os brasileiros que morreram na Itália estão aqui. Sessenta e cinco repousam em um recanto do Cemitério Militar Americano em Vada, e há ainda alguns raros em outros cemitérios da Itália. Todos estão sendo trasladados para cá. O total de brasileiros sepultados até o dia de minha visita é de 272, contando todos os cemitérios em que soldados nossos estão enterrados. Desses, 200 morreram em ação, no campo de luta: 25, feridos em combate, morreram nos hospitais; 8 foram vítimas de minas; 17 pereceram em acidentes de veículos; 4, em acidentes de avião; 4, em acidentes de armas; 2, afogados; 3, por desabamento (dois em conseqüência de bombardeio aéreo e um vítima de um teto que desabou ao peso da neve); 3, assassinados, e 6 mortos por doenças, em hospitais. No grande livro em que tomo dados está escrito também, entre muitas outras indicações, o lugar da morte. Monte Castelo é o nome mais freqüente nessa coluna. Quando os brasileiros conquistaram o Castelo, foram recolhidos, em Abetaia e em vários lugares do morro, 53 mortos brasileiros. Esses homens estavam na lista dos desaparecidos. Todos esses mortos foram identificados graças principalmente à diligência do infatigável e corajoso pastor João Soren, capelão protestante. O pessoal do Pelotão de Sepultamento me informa que seis dos mortos brasileiros recolhidos naquela região tinham sido sepultados pelos alemães. É preciso notar que o maior número de nossos mortos foi encontrado em Abetaia ou nas proximidades de Abetaia - um vilarejo que ficou muito tempo na "terra de ninguém", e onde só à noite os homens se arriscavam em patrulhas. Muitos cadáveres alemães foram encontrados insepultos na mesma região. Quem comanda o Pelotão de Sepultamento da FEB é o primeiro-tenente Lafaiete Vargas Brasiliano. O subcomandante é o segundo- tenente Copérnico Cordeiro de Arruda, que até pouco tempo atrás comandava um pelotão de fuzileiros do 6º RI. Eles me mostraram os arquivos, explicando os cuidados que são tomados. Tive a impressão de que os serviços estão bem organizados. De partida, ainda vejo, à margem do caminho, o pequeno cemitério muito limpo e bem cuidado, belo e simples com suas cruzes brancas, em meio à paz virgiliana das oliveiras. Nota: No fim da guerra, o nosso Cemitério Militar estava com cerca de 500 mortos. 

"Crônicas da Guerra  na Itália"
Rubem Braga



A Volta
Arquivo Diana Oliveira Maciel

Nas proximidades do Rio de Janeiro o "Gen. Meighs" aguardou a aproximação do Pedro II, navio brasileiro que conduzia o III Batalhão do Depósito do Pessoal, que desfilara pelas ruas de Lisboa sob simpáticos aplausos de seus habitantes, a pedido do Governo Português, desejoso de homenagear a Força Expedicionária Brasileira. Às 07:30 horas do dia 17 de setembro de 1945 entrávamos na Baía da Guanabara, em meio a um verdadeiro carnaval marítimo. Fomos cercados por lanchas, traineiras, rebocadores, barcos a vela e guarnições de clubes de remo, toda a sorte de embarcações, embandeiradas e fazendo soar seus diferentes tipos de apitos e buzinas. Todas aquelas embarcações estavam apinhadas de pessoas que gritavam, ovacionavam, soltavam foguetes, clamavam por nomes de parentes e amigos, o que nos levava a um sentimento de gratidão por todo o povo brasileiro, que ali se encontrava para demonstrar todo o seu reconhecimento por nossa ação, nosso sacrifício, com sua presença ululante para nos receber. O cais não tinha um só lugar vago, com gente trepada até nos guindastes e os contatos com os que estavam a bordo se processavam aos gritos, pois a verificação de nossa presença acabava com o sofrimento, a incerteza, o medo que cada um ainda tinha pela possível perda do ente querido. Às 10:00 horas esteve a bordo o Presidente da República, Dr. Getúlio Vargas, sendo recepcionado no salão de estar por toda a oficialidade e tendo sua mensagem de boas-vindas transmitida através de alto-falantes para todos os nossos elementos. Às 11:30 horas teve início o desembarque da tropa e em meio aos abraços e beijos de parentes, amigos e até desconhecidos, com enormes dificuldades, o Regimento foi se concentrando na Avenida Rodrigues Alves, preparando-se para o desfile. Finalmente, iniciou-se o desfile. Nenhum de nós poderia ter calculado a beleza do espetáculo que estava se desenrolando diante de nossos olhos. Quase toda a população da cidade estava nas ruas e para qualquer ponto que se olhasse lá estava a massa compacta, com suas bandeiras e flâmulas, a festejar, a aplaudir. A multidão, emocionada, dificultava a passagem dos "pracinhas". Aqui e ali fazia-se necessário o emprego da força contra a massa, massa de amor, que se abria e se fechava sobre o objeto de seu desejo. Não havia um só edifício em que as suas sacadas, janelas e marquises não estivessem apinhadas de pessoas - homens, mulheres e crianças. A cidade era uma coisa viva e saltitante, fervilhante de paixão. Uivavam as sirenes e gritava o povo. Bandas, militares e civis, tocavam dobrados e canções populares. Palmas estrugiam em ruídos de cascatas. Difícil era a passagem. Éramos forçados, às vezes, a ir até a fila indiana. O povo intrometia-se entre os soldados, que sorriam felizes por tudo aquilo - a recepção, a volta ao lar. Moças, senhoras e até homens beijavam e abraçavam os nossos soldados, que agradeciam sorrindo, alguns chorando. Os distintivos da "Cobra Fumando" desapareciam, passando a constituir-se em lembranças. De repente, senti-me no ar, carregado. Era um rapaz da Ilha de Paquetá, que depois vim a saber chamar-se Aníbal, caixeiro da loja do seu Diogo, cujo gesto foi logo imitado por outros, pois achavam que já tínhamos andado demais, cabendo a eles fazê-lo agora por nós. Cansados, apertados, triturados pelo entusiasmo do povo, chegamos à gare da Estrada de Ferro Central do Brasil e, em trens elétricos, fomos transportados para a Vila Militar onde o "ONZE" voltou a ocupar o seu antigo acantonamento no Morro do Capistrano. Como bem descreveu o jovem Vinícius de Moraes, no jornal Diretrizes, estávamos de novo em casa. "Pracinhas da Força Expedicionária Brasileira, vós sois os mais bem-vindos soldados da terra, pois que sois os nossos soldados. Perdoai não vos terem deixado marchar, em nome da emoção que a vossa volta nos causou. Estais finalmente em casa e isso nos entusiasma, porque voltastes para participar também da grande marcha do Brasil para a Democracia. Honra, e mais honra, e muita honra - que a honra é vossa! Honra a vós, atacantes de Castelnuovo, Monte Castelo e Montese, que propiciastes a vitória da Democracia fora e dentro de nosso país! Honra a vós homens do povo do Brasil que enfrentastes na nave o fogo do ódio inimigo! Honra, e mais honra, e honra ainda! A cidade vos recebe como os seus mais queridos filhos. Sede bem-vindos, pois que sois os mais bem-vindos de todos os soldados de todas as Pátrias, filhos deste solo pacífico, que vistes a morte de face, e que retornastes para uma Pátria feita mais consciente. Sede bem-vindos, pracinhas do Brasil".

"Montese - Marco Glorioso de uma Trajetória"
Cel. Adhemar Rivermar de Almeida



Retorno dos pracinhas brasileiros - a figura indicada é o cabo Carlos Scliar.
"Cadernos de Guerra - 1944-1945"

"Quando rompeu o dia 22 de agosto, não havia ninguém, desde o general até o último pracinha, que não estivesse perscrutando o horizonte para ver terra. O dia estava meio encoberto. Não iríamos ver a entrada da barra, seria possível? As nuvens toldaram o horizonte. Alguns barcos já vinham ao nosso encontro. Mas do Rio, nada. Por fim, as nuvens começaram a se abrir e surgiu o Cristo Redentor, de braços abertos. De longe parecia uma enorme cruz branca. Era o Rio. Lembrei-me então, repentinamente, daquela longínqua posição perdida nos Apeninos, quando uma noite ouvimos o locutor do rádio anunciar: 'Rio de Janeiro, Brasil!' Ali estava o Rio de Janeiro, aos nossos olhos. Muitos soldados ajoelharam-se no tombadilho, orando, muitos outros simplesmente em pé, olhando para o Cristo que surgia entre o claro das nuvens, que de longe parecia uma Cruz Branca indicando o nosso porto de destino: Rio de Janeiro, Brasil - fim desta longa estrada, onde cada encruzilhada ficou marcada por uma fileira de cruzes brancas."

Joaquim Xavier da Silveira
"Cruzes Brancas - Diário de um Pracinha"

 

Um Herói nunca morre!

Simples História de um Homem Simples
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